quarta-feira, 18 de agosto de 2010

A tragicômica morte de Darcy Sujeira

por Gustavo Caldas Brito

Daqui do alto do meu puleiro vi "quase" de tudo nessa casa. De despacho na sala de estar a dois amantes no armário. Confesso que muitas vezes tentei gritar,mas como só repito,não conhecia a palavra socorro...nem meus donos!

Meu pai,Seu Jorginho, era comerciante/traficante de aves raras,flamenguista de quatro costados e senil já na tenra idade (isso explica a preferência esportiva). Minha mãe era Dona Lola (ela detestava ser chamada assim,por isso insisto),mulher do norte,forte,de traços duros,cadeiras bem desenhadas e uma volúpia que deus me livre! Desculpem se não descrevo nosso bairro,ou ao menos nossa rua,daqui de cima vejo a sala,escuto banheiros e cozinha,mas da porta pra fora é o que Platão chamava de "além-caverna",nunca tive a chance.

Nossa sala era,pra ficar no mínimo,um bordel. Centenas de bibelôs,um urubuzinho do lado de São Judas Tadeu,um tapete de couro de vaca que,se pudesse falar,faria mais estrago que eu (e ao qual chamo "mimosa"),uma telefunken das antigas e um sofá gozado (gozado de engraçado,estranho ok?). Tá! Era gozado também. Minha sala é minha sala porque meus donos eram meio porcos e loucos,curtiam meus comentários durante a novela das oito. Pra começar,nem era pra eu estar aqui,era pra eu estar com a prima da Dona Lola,a Tita,uma deliciosa sambista bronzeada e solteira,autobatizada "beata dos infernos". Mas por infortúnio vim parar aqui,o Carlão (amante ou pau amigo da Tita, chamem como quiserem) não gostava muito de bichos,dizia que lembrava bichas,e por isso fui doado/despejado pra casa do Seu Jorginho e Dona Lola...

A rotina dos meus pais era bem agitada,pro trabalho e pro lazer. Durante a semana Jorginho passava o dia nas matas,caçando pardal,andorinha,periquito e araras enquanto aqui vinha sempre um pessoal passear nas matas da Dona Lola (parece que estavam atrás da periquita dela). É isso mesmo, Dona Lola era uma safada, daquelas de quatro costados,de ladinho e de tudo quanto é jeito! Era o Seu Jorginho virar as costas para os leiteiros da rua correrem para a ordenha diár...calma aê,vem gente aí! Daqui a pouco continuo.

Ah...tudo bem,é a Tita...olha que gostosurice latente! Não fosse o Carlão eu olharia pra isso tudo todo dia...merda! Vida de papagaio é difícil cara,se a gente repete muito neguinho fica puto,se repetimos pouco ameaçam jogar a gente fora!
Mas enfim,deixa ouvir aqui a conversa:

Carlão - ô nega,esse papagaio ainda tá vivo?
Tita - ele é lindo né,tão meiguinho,olha a carinha de tadinho dele!ehehheheh
Carlão- meiguinho pra mim é viado e viado tem que morrer!
Tita- quê isso Carlão,trauma do seu pai?
Carlão- já te falei pra não falar do papai assim,ele não é viado,é homossexual...
Tita- ah tá...tá bom...

*a conversa se muda para a cozinha

Ahahhahha,a Tita não perde a chance de alfinetar o Carlão! Sacanear um Creoulo (pelo porte e pela largura é Creoulo com "e" de energumeno) era um perigo gigante,ainda mais sendo o Carlão uma completa besta. Mas por trás da besta do Carlão havia um dócil e amável idiota,que corria atrás da Tita que nem cão abandonado. Cão abandonado que virava gato e sapato pelos caprichos da Tita.
Por falar em gato e sapato,lembrei de gato e rato,que me leva aos meus pais e a estória que vou contar se vocês ainda não tiverem atingido aquele ponto de querer me depenar e cometer suicidio coletivo.

Outro dia Jorginho saiu bem cedo pra caçar maritaca,deixando pra trás um tempão disponível para o bel prazer de Dona Lola. Aquele não era dia de leite ou leiteiro, era dia do Geraldo,pedreiro que tava restaurando a pensão do outro lado da rua. Nunca entendi o motivo de Dona Lola aceitar o Geraldo como amante,porra,o cara era zureta,manco e magricela! Mas Dona Lola já dizia: "quem vê cara troca logo a posição!". Dona Lola e suas tiradas maravi...porra, lá vem gente de novo! Me dá um minuto que continuo depois...

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